O consumo em alta produz cada vez mais lixo. Com isso, os aterros operam no limite. Entre as soluções viáveis estão a reciclagem e a logística reversa.
Julio Lamas
Foto de Victor Moriyama
Gramacho, em Duque de Caxias (RJ), foi o maior depósito de rejeitos da América Latina por 34 anos. O lixão foi fechado em junho de 2012
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Nos últimos anos, com certeza ficamos mais ricos. A afirmação do engenheiro Nelson Domingues, presidente da Ecourbis Ambiental, uma das concessionárias responsáveis pela coleta de lixo na cidade de São Paulo, vem acompanhada de preocupante constatação. "Lixo é reflexo de poder aquisitivo e consumo. Pela quantidade e pelo tipo de resíduo gerado, é possível ter uma noção da economia de uma cidade", explica Domingues.
Enquanto diz isso, estamos no topo de uma verde colina, de quase 160 metros de altura, a cerca de 30 quilômetros do centro de São Paulo, na divisa com os municípios de Mauá e Santo André. Do alto do morro, pisando na grama, assistimos ao voo de carcarás, quero-queros, bem-te-vis, falcões peregrinos, entre outras aves. Mas não estamos em nenhuma área preservada da Mata Atlântica. Sob nossos pés há enterradas 29 milhões de toneladas de lixo. "Isso nos faz refletir sobre nossos hábitos e sobre a sociedade de consumo em que vivemos", observa o engenheiro.
Equivalente à altura de um prédio de 40 andares, essa "montanha", com uma área 500 mil metros quadrados, é o aterro sanitário desativado Sítio São João. De 1992 a 2009, ele recebeu uma média de 175 mil toneladas de lixo por mês, geradas por 4,5 milhões de pessoas (que habitam 1,2 milhão de domicílios) das zonas sul e leste da capital paulista. Mesmo fora de operação, o que está abaixo de nós continua vivo. A relação entre o que compramos, levamos para casa e consumimos, ainda que efêmera, não se encerra nos grandes sacos pretos ou azuis em que colocamos o que sobrou nem quando os caminhões de coleta passam pela rua. "Os resíduos não desaparecem em um passe de mágica. Por causa da decomposição, são necessários monitoramento e controle geotécnico do aterro 24 horas por dia, pelos próximos 30 anos, para que não haja contaminação do solo, do ar e do lençol freático", explica Domingues. Marcos georreferenciais mostram a movimentação do solo e medidores indicam a pressão e a temperatura interna do aterro. Da deterioração dos resíduos ali depositados são drenados cerca de 21 milhões de litros de chorume (líquido proveniente da decomposição de matéria orgânica) por mês, um pouco menos da metade em relação à época em que o aterro estava em atividade. Além disso, 20 mil metros cúbicos de metano são extraídos por hora para gerar energia na maior usina termoelétrica do país, a Biogás. Ela funciona desde 2007 e por ano produz 200 mil megawatts, suficientes para abastecer uma cidade de até 400 mil habitantes.
Como São Paulo - maior metrópole da América do Sul e a décima cidade mais rica do planeta - não para de crescer e de gerar lixo, soluções e espaços para aterros precisam ser criados para destinar as atuais 18 300 toneladas de resíduos geradas todos os dias. A cada dia, um paulistano produz cerca de 1,5 quilo, segundo dados da Autoridade Municipal de Limpeza Urbana (Amlurb). Cerca de 12 mil toneladas diárias se originam nos domicílios (residências, condomínios e escritórios) e nas 871 feiras livres, realizadas todos os dias. O restante é resultado da varrição de ruas, do recolhimento de entulho descartado nas vias públicas e dos serviços de manutenção da cidade. Para dar conta de parte disso, ao lado do Sítio São João, desde 2010 opera a Central de Tratamento de Resíduos Leste, um aterro sanitário (veja as principais diferenças entre lixão, aterro sanitário e aterro controlado, no infográfico , com 1,1 milhão de metros quadrados, que, de segunda a sábado, recebe a visita de 250 caminhões - cada um deles deposita cerca de 30 toneladas de lixo.